Além de 400 mil dólares, o ex-policial também teria recebido dois terrenos para iniciar uma nova milícia na Zona Oeste do Rio
Trechos da delação premiada firmada pelo ex-policial militar Ronnie Lessa à Polícia Federal revelam que os mandantes da morte de Marielle Franco ofereceram a ele e a outro comparsa dois loteamentos clandestinos na Zona Oeste do Rio de Janeiro para a instalação de uma nova milícia.
Segundo Lessa, a exploração imobiliária irregular no local poderia render mais de 20 milhões de dólares. Os trechos da delação foram exibidos pelo programa Fantástico, da TV Globo, neste domingo 26.
O ex-PM admitiu ter matado a vereadora a mando dos irmãos Chiquinho e Domingos Brazão. Segundo ele, a proposta que envolvia os terrenos foi oferecida e ele e ao também ex-PM Edimilson de Oliveira, conhecido como Macalé, assassinado em 2021.
“Era muito dinheiro envolvido. Na época, daria mais de US$ 20 milhões. A gente não está falando de pouco dinheiro (…) Ninguém recebe uma proposta de receber US$ 10 milhões simplesmente para matar uma pessoa. Uma coisa impactante realmente”, afirmou.
Apesar de não afirmar quando o empreendimento imobiliário ilegal teria início, o delator disse que seria um dos donos.
“A gente ia criar uma milícia nova. Então ali teria a exploração de ‘gatonet’, a exploração de kombis, venda de gás… A questão valiosa é depois. A manutenção da milícia que vai trazer voto”, confessou aos agentes.
Na delação, Lessa contou ainda que faria parte de uma “sociedade” com os irmãos Brazão.
“Então, na verdade, eu não fui contratado para matar Marielle, como um assassino de aluguel. Eu fui chamado para uma sociedade.”
Os terrenos envolvidos nas negociações do crime estão localizados em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Ainda segundo o delator, Marielle era considerada “uma pedra no caminho”.
“Ela teria convocado algumas reuniões com várias lideranças comunitárias, se eu não me engano, no bairro de Vargem Grande ou Vargem Pequena, justamente para falar sobre esse assunto, para que não houvesse adesão a novos loteamentos da milícia. Isso foi o que o Domingos passou para a gente. Que a Marielle vai atrapalhar e para isso ela tem que sair do caminho”, afirmou.
O ex-PM ainda afirmou ter se reunido com os mentores do crime três vezes, sendo duas antes do assassinato e uma depois.
“O Domingos fala mais e o Chiquinho concorda. E o local escuro, propício ao encontro. Um encontro secreto porque a situação pedia uma coisa dessa, isso seria muito mais inteligente do que sentar numa churrascaria”, revelou. Apesar dos encontros constarem da delação, o relatório da Polícia Federal apontou que não foi possível obter provas que corroborassem esse trecho do relato.
O atirador ainda citou o envolvimento de Rivaldo Barbosa como um dos autores intelectuais do assassinato.
Ele foi apontado como “peça-chave” para a execução do crime contra a vereadora e o motorista Anderson Gomes. Segundo o delator, o delegado seria o responsável para que os suspeitos não fossem investigações pelo inquérito que seria aberto para apurar o crime.
O delegado acusado assumiu a chefia da Polícia Civil do Rio um dia antes do assassinato de Marielle. Segundo relatório policial, Rivaldo teria recebido 400 mil reais para obstruir as investigações do caso.
O trecho da delação divulgado também mostrou que Marielle não foi a primeira escolha de vítima dos irmãos Brazão. A escolha óbvia seria, segundo Lessa, o ex-deputado Marcelo Freixo (PT), atual presidente da Embratur.
Depois de diversas discussões sobre o alvo, o ex-PM conta que conseguiu mudar a ideia dos mandantes devido à dificuldade de atingir Freixo que “gozava de grande projeção política” e eliminá-lo, poderia gerar “grande repercussão”, disse o delator.
Segundo relatório da PF, durante a preparação para o crime, Lessa teria realizado pesquisas online sobre outros políticos ligados ao PSOL, incluindo Freixo, que na época ainda era filiado ao partido, assim como Marielle.
Freixo foi o responsável pela abertura da CPI das Milícias, ainda em 2008, procedimento no Legislativo fluminense para apurar o envolvimento de políticos na atuação de grupos criminosos no Rio. O relatório final do colegiado cita os irmãos Brazão como beneficiário do “curral eleitoral” formado pela pressão da milícia de Oswaldo Cruz, na Zona Norte da capital carioca.
Os Brazão negam a autoria dos crimes. Segundo o advogado da dupla, não existem elementos que sustentem a versão apresentada por Lessa em delação premiada. A defesa de Rivaldo Barbosa também nega o envolvimento do delegado no crime. Segundo os advogados dele, o agente nunca teve contato com os irmãos e que não recebeu nenhum valor proveniente de ator ilícitos.
Chiquinho Brazão, Domingos Brazão e Rivaldo Barbosa estão presos preventivamente enquanto aguardam julgamento.
Fonte: Carta Capital
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